BAGDÁ (Reuters) - O Irã prometeu vingança severa depois que um ataque aéreo dos Estados Unidos em Bagdá na sexta-feira matou Qassem Soleimani, comandante da força de elite iraniana Quds e arquiteto da crescente influência militar do país no Oriente Médio.
Soleimani era um general considerado a segunda figura mais poderosa do Irã, depois apenas do líder supremo, aiatolá Ali Khamenei.
O ataque noturno dos EUA, autorizado pelo presidente Donald Trump, marcou uma escalada dramática em uma disputa no Oriente Médio entre o Irã e os Estados Unidos e seus aliados, principalmente Israel e Arábia Saudita.
O comandante da principal milícia do Iraque, Abu Mahdi al-Muhandis, conselheiro de Soleimani, também foi morto no ataque.
O Irã está envolvido em um prolongado conflito com os Estados Unidos, que se agravou na semana passada com um ataque à embaixada dos EUA no Iraque por milícias pró-Irã após um ataque aéreo dos EUA à milícia Kataib Hezbollah, fundada por Muhandis.
O Pentágono disse que as Forças Armadas dos EUA "tomaram uma ação defensiva decisiva para proteger pessoal dos EUA no exterior ao matarem Qassem Soleimani", e que o ataque foi ordenado por Trump para interromper planos de futuros ataque iranianos.
Autoridades norte-americanas, falando sob condição de anonimato, disseram que Soleimani foi morto em um ataque de drone. A Guarda Revolucionária do Irã disse que ele foi morto em um ataque de helicópteros dos EUA.
Preocupações com uma possível interrupção do fornecimento de petróleo no Oriente Médio elevaram os preços da commodity em quase 3 dólares.
Khamenei disse que uma vingança severa aguarda os "criminosos" que mataram Soleimani. A morte, embora amarga, vai dobrar a motivação da resistência do Irã contra os Estados Unidos e Israel, disse o aiatolá.
Em comunicado divulgado pela televisão estatal, Khamenei pediu três dias de luto nacional.
A embaixada dos EUA em Bagdá pediu a todos os cidadãos norte-americanos que deixassem o Iraque imediatamente.
HERÓIS NUNCA MORREM
Soleimani comandava a força Quds, a divisão estrangeira da Guarda Revolucionária, e teve um papel crucial nos combates na Síria e no Iraque.
Durante mais de duas décadas, ele se destacou na projeção da influência militar da República Islâmica no Oriente Médio, adquirindo o status de uma celebridade no país e no exterior.
Apresentadores da televisão estatal iraniana se vestiram de preto e transmitiram imagens de Soleimani usando binóculos em um deserto e saudando um soldado, e de Muhandis falando a seguidores.
O presidente do Irã, Hassan Rouhani, disse que o assassinato tornará seu país mais determinado na resistência aos EUA, e a Guarda Revolucionária disse que forças anti-EUA buscarão vingança em todo o mundo muçulmano.
Centenas de iranianos marcharam rumo ao complexo de Khamenei, no centro de Teerã, para transmitir seus pêsames.
"Não sou uma pessoa pró-regime, mas gostava de Soleimani. Ele era corajoso e amava o Irã, lamento muito por nossa perda", disse a dona de casa Mina Khosrozadeh na capital.
Na cidade-natal de Soleimani, Kerman, pessoas vestidas de preto se reuniram diante da casa de seu pai, chorando enquanto ouviam a recitação de versos do Alcorão.
"Heróis nunca morrem. Não pode ser verdade. Qassem Soleimani sempre viverá", disse Mohammad Reza Seraj, professor do ensino médio.
Trump, que enfrenta acusações de impeachment no Congresso dos EUA, não fez nenhum comentário de imediato, mas publicou uma imagem da bandeira norte-americana no Twitter.
A presidente da Câmara dos Deputados dos EUA, Nancy Pelosi, uma democrata e crítica contundente do presidente republicano, disse que o ataque foi realizado sem consulta ao Congresso e sem autorização para o uso de força militar contra o Irã.
O primeiro-ministro iraquiano, Adel Abdul Mahdi, repudiou as mortes, que viu como uma violação das condições da presença militar dos EUA em sua nação e um ato de agressão que desrespeitou a soberania do Iraque e levará a uma guerra.
O principal clérigo xiita iraquiano, o grande aiatolá Ali al-Sistani, classificou as mortes como uma violação da soberania e dos acordos internacionais. Ele exortou todas as partes envolvidas a praticarem a moderação.
O governo sírio, do presidente Bashar al-Assad, repudiou o que qualificou como uma agressão criminosa dos EUA.
Israel considerava Soleimani como uma grande ameaça durante muito tempo. O premiê Benjamin Netanyahu encurtou uma visita à Grécia, e a rádio do Exército israelense disse que os militares entraram em estado de alerta avançado.
A força Quds, assim como unidades paramilitares aliadas que vão do Hezbollah libanês ao agrupamento de milícias iraquianas apoiadas pelo Irã conhecido como Forças de Mobilização Popular --milícias com experiência de combate e armadas com mísseis-- têm meios amplos para reagir.
Em setembro, autoridades dos EUA culparam o Irã por um ataque com mísseis e drones a instalações petrolíferas da gigante estatal de energia saudita Saudi Aramco.
O Irã, por sua vez, sofreu dezenas de ataques aéreos e de mísseis, realizados principalmente por Israel, contra seus combatentes e forças aliadas na Síria e no Iraque.
FIGURA LENDÁRIA
Analistas dizem que o Irã provavelmente responderá vigorosamente à morte de Soleimani, que havia sobrevivido a várias tentativas de assassinato de agências ocidentais, israelenses e árabes ao longo das últimas duas décadas.
A força Quds, encarregada de realizar operações além das fronteiras iranianas, amparou Bashar al-Assad quando ele parecia perto de uma derrota na guerra civil que transcorre desde 2011 na Síria, e também ajudou milícias a vencerem o Estado Islâmico no Iraque.
Soleimani assumiu o comando da força em 1998, e a partir de então fortaleceu discretamente os laços iranianos com o Hezbollah no Líbano, com o governo sírio e com milícias xiitas iraquianas.
Muhandis, por sua vez, supervisionava a PMF, uma aliança de grupos paramilitares do Iraque composta principalmente por milícias xiitas amparadas pelo Irã que foram integradas formalmente às Forças Armadas iraquianas.
Sua milícia Kataib Hezbollah, que recebeu treinamento de combate do Hezbollah, visou forças dos EUA durante muito tempo e foi um dos primeiros grupos a enviar combatentes à Síria para auxiliar Assad.
(Reportagem adicional de Idrees Ali, em Washington; Michael Georgy, em Dubai; Maha El Dahan, em Bagdá; e Stephen Farrell, em Jerusalém)
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